
“O
verdadeiro milagre não é a rara recuperação de uma doença incurável, mas a possibilidade
fenomenal de utilizar a música e o tom de uma forma fácil e barata para
melhorar a qualidade da vida quotidiana”
(Campbell, 2000,
p. 210)
No âmbito da
enfermagem, a música já era abordada por Florence Nightingale,
percursora da enfermagem, ao afirmar que instrumentos de sopro, nos quais se insere a
voz humana, e instrumentos de cordas, que produzem sons
contínuos, são capazes de produzir efeitos benéficos, contrariamente aos
instrumentos que produzem sons fortes. Deste modo, pode-se afirmar que nesta
época, a música já era utilizada de forma terapêutica nos hospitais, porém,
acarretava custos altos, o que impossibilitou a sua utilização (Nightingale, 1989, cit. in Vicente, 2011).
Atualmente, a inserção das novas tecnologias tornou o acesso à música mais
fácil, para além do aparecimento do novo paradigma que visa um cuidado holístico
e humanizado, e portanto que promove a utilização de recursos enriquecedores dos cuidados de enfermagem, como a música (Bergold & Alvim, 2009, cit. in Vicente,
2011).
Assim, como a música atinge qualquer idade, sexo, raça, religião e nacionalidade, o mundo está a tornar-se musical. As pessoas começam a procurar terapias alternativas pois os métodos invasivos, dispendiosos e prejudiciais podem piorar a situação. Os cuidados poderão ser mais eficientes e criativos através da integração da mente e do corpo no processo de saúde. Inicialmente, a música pode não trazer grandes efeitos, mas como acontece com a tolerância a certa terapêutica, a pessoa pode habituar-se à música. Neste sentido, esta tem vindo a representar a ponte entre o tratamento tradicional e a medicina moderna, no entanto, os médicos atuais ainda se encontram receosos devido ao facto de parecerem técnicas muito fáceis, seguras, eficazes e baratas (Campbell, 2000).
O poder da música depende principalmente da composição, do intérprete, do ouvinte e da sua postura, podendo provocar, por um lado, efeitos estimulantes ou, por outro, efeitos invasivos. As músicas altas e agitadas podem carregar positivamente o cérebro, ocultando o sofrimento e a tensão. Já os ruídos de frequência elevada podem tornar-se “tóxicos” para o organismo, podendo mesmo causar dores de cabeça e um desequilíbrio. Para além disto, os sons de baixa frequência também podem ser prejudiciais para o organismo, podendo mesmo furar os tímpanos, provocar dor e contrações musculares, e consequentemente, criar uma situação de stress. Independentemente do tipo de efeito proporcionado pela música, esta acaba por produzir mudanças mentais e físicas (Campbell, 2000).
De acordo com Padilha (2008), a musicoterapia consiste na utilização da música através dos seus elementos, isto é, o ritmo, a melodia e a harmonia, por parte de um musicoterapeura qualificado. Esta destina-se a atender uma pessoa ou grupo de pessoas que necessitam de ajuda na comunicação, relação, aprendizagem, entre outros problemas. A musicoterapia tem como objetivos principais a relação positiva do doente com outras pessoas, o desenvolvimento da autoestima e a promoção de energia e ordem através da utilização do ritmo (Pinelli & Santelli, 2005, cit. in Padilha, 2008).
Segundo Vicente (2011), a enfermagem tenta unir, na sua prática, a ciência com a arte, e ao utilizar a criatividade com recurso à música pode ampliar os seus cuidados e enriquecer a comunicação e relação com a pessoa. As estratégias relacionadas com a música podem variar desde o canto, as vocalizações, a improvisação até à composição de letras e o manejo com instrumentos (Hatem, 2005, cit. in Vicente, 2011). Assim, o enfermeiro pode estar mais proximo das dimensoes fisica, mental, emocional e espiritual da pessoa, tendo em vista a promoção da sua saúde e do seu bem-estar (Leao, Puggina, Gatti, Almeida & Silva, 2011; Vicente, 2011).
Cardoso (2010) defende que a música para ser utilizada de forma terapêutica não necessita obrigatoriamente de um musicoterapeuta, mas sim de um profissional academicamente especializado. Como o enfermeiro é o profissional mais próximo do doente, isto confere-lhe a oportunidade para personalizar os seus cuidados, no sentido de que pode não só melhorar a saúde da pessoa como também desenvolver as suas capacidades e promover-lhe um equilíbrio físico, psicológico e emocional.
Desta forma, a musicoterapia é diferente da utilização da música como recurso em enfermagem, dado que a primeira é realizada por um profissional especializado, através de um tratamento estruturado e com um objetivo definido (Silva et al, 2008, cit. in Vicente, 2011). Já a segunda pode ser denominada por música terapêutica, na qual o enfermeiro complementa os seus cuidados através da música (Leão, 2002, cit. in Vicente, 2011). O enfermeiro pode utilizar a música em diferentes contextos, conforme o momento que achar mais propício, cabendo ao mesmo avaliar se os efeitos são benéficos, dado que cada doente tem as suas preferências musicais e portanto reage de forma diferente aos estímulos sonoros (Cardoso, 2010).
O segredo é olhar para a pessoa como um todo, para além dos sintomas que esta apresenta, sendo o tratamento, por vezes, mais paliativo que terapêutico. Isto não nega as utilizações práticas da música como recurso terapêutico, pois esta tem efeitos a nível do diagnóstico de doenças, do aumento da atividade motora, da motivação da pessoa, da estimulação da comunicação com os profissionais de saúde e da complementação do tratamento convencional (Campbell, 2000).
A utilização da música nos cuidados pode ser uma técnica pouco dispendiosa e aparentemente simples, dado que, é, pelo contrário, uma intervenção complexa que implica dedicação e raciocínio para adequar a estratégia mais adequada a cada pessoa. Em suma, o desafio de enfermagem é utilizar a música de forma holística e humanizada, e não de forma banalizada (Leão et al., 2011).
Referências Bibliográficas:
Campbell, D. (2000). O efeito Mozart: clássica, jazz, rock ou pop, a
música ajuda a tratar o corpo, a fortalecer a mente e a despertar o espírito
criativo. Cruz Quebrada: Estrelapolar.
Cardoso, A.J.S. (2010). A utilização da música como coadjuvante terapêutico
na saúde mental e psiquiatria. Dissertação em Ciências de Enfermagem (trabalho não publicado), Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade
Fernando Pessoa, Porto.
Leao, E.R., Puggina, A.C., Gatti, M.F.Z., Almeira, A.P. & Silva, M.J.P.
(2011). Música e Enfermagem: um recurso integrativo. Acedido em 10 de
Dezembro, 2012, em http://www.claudiapuggina.com/producao/Cap%2010%20-%20Musica%20e%20Enfermagem-um%20recurso%20integrativo.pdf
Padilha, M.C.P. (2008). A musicoterapia no
tratamento de crianças com perturbação do espectro do autismo. Mestrado Integrado em Medicina (trabalho não
publicado), Faculdade de Ciências da Saúde da
Universidade da Beira Interior, Covilhã.
Vicente, A.N.M. (2011). O uso da música nas práticas de enfermagem: uma
revisão integrativa. Dissertação em Enfermagem (trabalho não publicado),
Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre.
Excelente !
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